segunda-feira, novembro 27

Assimetria cultural e iliteracia regional

Olhando para o título dará a impressão de haver gafe. Não! Portugal é pequeno, o bastante para dizermos que é somente norte e sul, litoral e interior, mas as diferenças entre regiões e níveis culturais são enormes. Há dias na rádio ouvia falar de um projecto em Almodôvar de uma biblioteca itinerante cujo objectivo seria o de criar hábitos de leitura na população daquela Vila Alentejana. Uma senhora com cerca de quarenta anos quando questionada pelo jornalista acerca do sucesso do projecto dizia: “Eu agora já leio! Leio o livro dos remédios caseiros e a Bíblia à noite! Adormeço num instante!” Este facto fez-me pensar. Numa cidade desenvolvida feita a mesma pergunta a um cidadão comum, provavelmente a resposta ao que lia teria sido um qualquer livro de Paulo Coelho. Será só uma questão de acesso à cultura e ao meio onde estamos inseridos? Porque é que a primeira senhora nunca vai ler um livro de Paulo Coelho, ou de qualquer outro autor mais cosmopolita? Será conspiração dos centros urbanos por forma a manterem a sua hegemonia perante o interior? Ou será algo mais elaborado? A justificação que acredito ser a mais válida vem de um fenómeno usado vulgarmente nos meios de comunicação de massas (rádio, televisão e jornais) é chamado de menor cultura comum. Uma teoria de Jean Baudrillard em que o objectivo é nivelar por baixo o mais possível o nível cultural da informação prestada, de modo a ser entendido pelo maior número de pessoas possível. Consegue-se com isto abranger uma maior audiência, recorrendo menos a segmentação e recursos de meios distintos. Um cidadão do interior, afastado dos meios culturais por natureza geográfica e cultural, nunca aspirará a consumir cultura de cidade, porque na maioria dos casos não tem informação sobre ela ou acesso. É mais fácil dar às pessoas algo barato e banal como um Sic 10 horas ou Fátima Lopes, com cusquices que nada ajudam à evolução e bastante publicidade nos intervalos a puxar ao consumismo. Ora isto é vergonhoso. Em vez de puxarmos pelas pessoas, limitamo-las áquilo que lhes é apresentado, e que faz parte quase de uma cultura medieval. É por estes motivos que o nosso país dificilmente terá um interior desenvolvido. E o problema não se resolverá com a toma de um qualquer xarope caseiro de cultura.

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